O novo pacote tarifário anunciado por Donald Trump no início de abril reacendeu discussões sobre os rumos do comércio global — e entre os setores mais impactados está o automotivo. Mas, ao contrário do que muitos imaginam, o Brasil pode encontrar uma oportunidade nesse cenário.

Com um aumento de apenas 10% nas tarifas para os produtos brasileiros, o país passa a ter uma vantagem competitiva frente a grandes players asiáticos e europeus, que sofrerão elevações ainda mais pesadas. Para especialistas, essa diferença cria uma brecha que pode ser explorada para ampliar a presença nacional no mercado americano.

De acordo com dados do Sindipeças, o setor de autopeças brasileiro embarcou US$ 1,4 bilhão para os Estados Unidos em 2023 — valor que representa 17,5% das exportações totais do setor. Agora, com as novas barreiras tarifárias atingindo com mais força países como China e membros da União Europeia, os produtos brasileiros podem se tornar mais atrativos no curto e médio prazo.

Jackson Campos, especialista em comércio exterior, enxerga o momento como estratégico. “Mesmo com a nova tarifa, o produto brasileiro ainda chega mais barato do que o chinês ou o europeu. Se temos qualidade e capacidade produtiva, agora é a hora de reforçar nossa presença nos Estados Unidos. A diferença de custo pode ser decisiva na hora da compra”, comenta.

Apesar do otimismo em torno da competitividade, o alerta vem para o impacto em cadeia que as novas medidas podem causar. Parte dos componentes utilizados na fabricação de autopeças no Brasil vem dos próprios Estados Unidos. Com as novas tarifas, esses insumos chegarão mais caros ao país, pressionando os custos da indústria nacional e, consequentemente, os preços ao consumidor final.

O risco, segundo Campos, é que o reajuste dos valores acabe sendo repassado integralmente ao consumidor. “Itens como motores e transmissões devem sofrer reajustes, o que pode tornar as manutenções mais caras. O brasileiro pode acabar optando por peças de qualidade inferior para economizar — algo preocupante do ponto de vista da segurança e durabilidade”, afirma.

Outro ponto delicado envolve empresas brasileiras com operações nos Estados Unidos. As que possuem unidades de manufatura no país devem arcar com custos extras ao importar insumos do Brasil. Já aquelas que atuam apenas com centros de distribuição devem sentir impactos mais leves, mas ainda assim precisam se preparar para lidar com possíveis perdas de mercado frente à concorrência com fornecedores locais ou de países com tratamento tarifário mais favorável.

Diante do novo cenário, o caminho passa pela adaptação rápida: diversificar mercados, renegociar contratos e buscar acordos bilaterais que atenuem os efeitos negativos das novas tarifas.

“O Itamaraty tem um papel fundamental agora. É hora de pensar estrategicamente no impacto ao consumidor e no fortalecimento da nossa indústria. O momento é de cautela, mas também de ação”, conclui Campos.