Durante anos, terras raras foram um tema restrito a especialistas em mineração e indústria de defesa. Agora, o assunto ganha manchetes internacionais e coloca o Brasil no centro de uma corrida estratégica entre as maiores potências do mundo.
Na última semana, os Estados Unidos assinaram um acordo com a Ucrânia para exploração desses minerais. Dias antes, o governo Trump autorizou projetos de mineração no fundo do oceano. Ambos os movimentos fazem parte de uma estratégia clara: reduzir a dependência da China, que hoje domina a produção e o refino global de terras raras.
Enquanto isso, o Brasil — dono da segunda maior reserva mundial — se destaca como uma alternativa mais segura e geopoliticamente estável.
O ativo que o mundo quer — e o Brasil ainda pouco explora
Com cerca de 25 milhões de toneladas em reservas, o Brasil tem um potencial geológico inegável. Mas a produção efetiva ainda é tímida: menos de 0,01% da oferta mundial em 2024.
Enquanto a China produziu 270 mil toneladas de óxidos de terras raras no ano passado, o Brasil entregou apenas 20 mil toneladas — quase tudo com destino à própria China, por falta de infraestrutura de refino e de contratos de longo prazo com compradores ocidentais.
A única mina comercial em operação no país, a Serra Verde, em Goiás, começou a produzir no fim de 2023. E sua produção futura já está contratada pelos chineses.
Mais que mineração: uma disputa geopolítica
O cenário mudou. Com a China restringindo exportações e os EUA ampliando sua ofensiva por novas fontes, o interesse estrangeiro pelo Brasil cresceu.
Empresas como Aclara, Meteoric Resources e Brazilian Rare Earths aceleram projetos locais, enquanto investidores australianos, canadenses e até representantes do governo americano fazem visitas frequentes aos empreendimentos.
Mas os desafios são grandes: o licenciamento ambiental é demorado, a cadeia de valor local é incipiente e o risco para investidores é elevado. Um projeto típico leva cerca de 8 a 10 anos entre a fase de exploração e o início da produção comercial.
O gargalo dos compradores
Além das questões estruturais, o grande obstáculo está na ausência de compradores dispostos a firmar contratos de longo prazo — o chamado offtake, essencial para viabilizar financiamentos e tirar projetos do papel.
“A corrida não é só geológica, é geopolítica”, resume Murilo Nagato, diretor da Aclara no Brasil, que busca um sócio estratégico para garantir escala e capacidade de produção.
Por enquanto, os EUA e seus aliados ainda hesitam. A maior parte da produção mundial — e praticamente 100% do refino das terras raras pesadas — permanece nas mãos da China.
Brasil no tabuleiro global
Com um ambiente doméstico desafiador e uma disputa geopolítica em curso, o Brasil está no centro de um jogo de xadrez mineral que pode definir a cadeia global de energia, defesa e tecnologia para as próximas décadas.
“Cada contrato hoje pode selar o alinhamento de um projeto por 20 ou 30 anos”, afirma Rafael Marchi, da Alvarez & Marsal.
Agora, a questão que fica é: o Brasil vai conseguir aproveitar o momento para transformar suas reservas em poder econômico? Ou continuará apenas como fornecedor de base para os outros refinarem?