O mês de setembro trouxe uma sequência de marcos históricos para a Bolsa brasileira. O Ibovespa superou os 144 mil pontos pela primeira vez no intraday no dia 11 e encerrou sessões acima dos 143 mil pontos, consolidando o melhor desempenho de sua história. O movimento levanta uma questão central: até onde o mercado pode ir?

Otimismo com cautela

Gestores e analistas apontam que, embora exista espaço para uma pausa após a disparada recente, a trajetória ainda é positiva. O pano de fundo é o mesmo que vem sustentando bolsas emergentes: expectativa de corte de juros nos EUA e no Brasil. O enfraquecimento do mercado de trabalho americano fortalece a visão de que o Federal Reserve pode reduzir as taxas já na reunião de 17 de setembro.

No Brasil, a leitura é semelhante. Com inflação arrefecendo, cresce a aposta de que o Banco Central poderá sinalizar, ainda este ano ou no início de 2026, o início de um ciclo de afrouxamento monetário.

O que anima os investidores

Daniel Utsch, gestor da Nero Capital, vê três pilares para justificar uma visão otimista:

Cenário global: dólar mais fraco e impacto limitado da guerra comercial sobre o Brasil.

Cenário doméstico: resultados corporativos positivos e expectativa de corte da Selic.

Valuation da Bolsa: ações ainda subavaliadas, com potencial de retomada no fluxo de estrangeiros.

Segundo ele, o recorde recente não deve ser lido como topo, mas como correção de valor. “Considerando CDI e prêmio de risco, a Bolsa ainda deveria estar em patamar superior. Estamos longe de um pico que represente euforia generalizada”, diz.

O papel dos juros americanos

Para Fernando Tendolini, head de renda variável da Fator Administração de Recursos, o corte de juros pelo Fed pode ser o principal catalisador da próxima pernada de alta. Um dólar mais barato e menor custo de oportunidade no exterior criam espaço para que bancos centrais, inclusive o brasileiro, adotem tom mais suave.

Ele também ressalta que a agenda fiscal no Congresso segue no radar, especialmente a compensação para a isenção do Imposto de Renda até R$ 5.000, que pode trazer mais clareza sobre as contas públicas.

Projeções mais ousadas

Algumas casas de análise já projetam o Ibovespa próximo dos 150 mil pontos ainda em 2025. Para a XP, o índice pode encerrar o ano nesse patamar, apoiado pelo fim do ciclo de aperto monetário, inflação controlada e maior interesse em ações em meio à proximidade do ciclo eleitoral de 2026.

O Bradesco BBI também aposta na entrada de capital como motor de valorização. Segundo estimativas, a indústria de gestão de ativos pode recuperar R$ 1,1 trilhão em aportes, elevando em 40% os fundos dedicados ao mercado local.

Setores preferidos

Apesar da alta, a preferência dos gestores segue em setores sólidos, menos expostos a riscos políticos e financeiros. Tendolini destaca construção civil, saúde, educação e consumo discricionário como destaques. O BBI cita ainda varejo de alimentos, vestuário e e-commerce, que podem se beneficiar diretamente da queda de juros.

Riscos no radar

O otimismo não elimina os pontos de cautela. A crise política interna, com a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro pelo STF e tensões no Congresso, continua a pesar. No campo econômico, a revisão para baixo das projeções de crescimento do PIB e inflação adiciona incertezas.

No exterior, os números mais recentes do CPI americano ficaram acima do esperado, mas o mercado interpreta que o enfraquecimento do emprego deve prevalecer como argumento a favor dos cortes de juros. Ainda assim, isso pode colocar o Fed diante de um dilema: como reduzir taxas sem reaquecer pressões inflacionárias?

E o alvo dos 150 mil?

Para Bruno Takeo, estrategista da Potenza Capital, a meta é possível, mas não por mérito exclusivo do Brasil. “É o diferencial de juros que favorece nossa Bolsa. A atratividade vem da comparação com outros mercados”, explica.

Por enquanto, o Ibovespa segue surfando um momento raro: liquidez internacional em busca de emergentes, fundamentos locais mais sólidos e expectativa de cortes no radar. O próximo grande teste será justamente a reunião do Fed.